Uma análise criteriosa do legado de Roberto Campos Neto na presidência do Banco Central

Afinal, qual foi o legado de Roberto Campos Neto à frente do Banco Central?

Os mais críticos diriam que ele estava sabotando o governo Lula, jogando contra o país. 

Já seus defensores mostrariam as várias premiações recebidas mundo afora como prova de sua excelência. 

Pois eu discordo das duas posições; não compartilho da principal crítica da esquerda e tenho críticas que muitos da direita discordariam.

Neste artigo, vou compartilhar a minha avaliação sobre o mandato de Campos Neto na liderança do BC nos últimos seis anos. 

Mas, antes, alguns esclarecimentos importantes:

  1. As circunstâncias importam, e muito

Campos Neto enfrentou uma pandemia sem precedentes, que jogou o mundo à beira de uma depressão, e, logo depois, a maior inflação global em quatro décadas. 

Também enfrentou uma troca de governo com programas econômicos bem diferentes.

  1. A herança passada também importa

Sem dúvida alguma, há efeitos que são resquícios de políticas passadas, para o bem e para o mal. 

Por exemplo, Henrique Meirelles recebeu a economia desarranjada em 2003, e Campos Neto recebeu a casa em ordem, quando Ilan passou o bastão para ele em 2019. 

A avaliação também não é uma corrida que se inicia do zero, porque há uma bagagem recebida e, portanto, condições iniciais que restringem e podem influenciar os resultados posteriores.

  1. Algumas políticas certamente tiveram influência de Paulo Guedes, então ministro da Fazenda

Paulo Guedes sempre falava do seu mix de política fiscal mais apertada e política monetária mais frouxa, deixando o câmbio mais solto. 

E, como acontece normalmente, a política econômica do ministro da Fazenda acaba também influenciando os rumos do Banco Central.

Feito esse preâmbulo, vamos então analisar a presidência de Campos Neto.

Primeiro, uma avaliação objetiva, utilizando critérios que nos permitam comparar os últimos presidentes do Banco Central. Depois, uma avaliação subjetiva.

Em um passo a passo simplificado, descubra como montar uma exposição antifrágil na prática.

Uma avaliação objetiva do mandato de Roberto Campos Neto

Para fazer essa avaliação objetiva, selecionei algumas métricas: 

  1. Cumprimento da meta de inflação
  2. Inflação média ao longo do seu mandato
  3. Taxa de juros praticada ao longo do mandato
  4. Taxa de juros real
  5. Comportamento da taxa de câmbio

Resolvi utilizar como ponto de partida 1999, que foi quando começamos o regime de metas de inflação. 

Então, vamos comparar desde Armínio Fraga, Henrique Meirelles, Alexandre Tombini, Ilan Goldfajn e, finalmente, Roberto Campos Neto.

Inflação

Primeiro, vamos analisar sob a ótica das metas de inflação.

Como a gente pode observar no gráfico, tivemos três grandes picos de inflação nesse período:

  1. O primeiro ocorreu no final de 2002 e início de 2003, na transição entre Armínio Fraga e Henrique Meirelles. A grande causa deste surto inflacionário foram os temores com o novo governo Lula e a disparada do câmbio que isso provocou.
  2. Depois, tivemos um grande pico durante a gestão de Alexandre Tombini, no início de 2016. Podemos dizer que foi um momento externo relativamente mais tranquilo, portanto, foram problemas domésticos que geraram esse pico de inflação no mandato de Tombini, que chegou a mais de 10% ao ano.
  3. Finalmente, houve o grande pico durante a pandemia, atingindo 12,1% em 2022, já na gestão de Roberto Campos Neto.

Qual é a semelhança entre todos os presidentes? Todos estouraram o limite superior ou inferior de tolerância da meta de inflação.

Portanto, todos tiveram que escrever sua carta aberta justificando por que não conseguiram manter a inflação dentro da banda de tolerância.

O curioso foi o caso de Ilan Goldfajn, que não atingiu nem o limite inferior. Durante seu primeiro ano de mandato, em 2017, a inflação acabou se situando abaixo do limite inferior da meta.

Agora, na comparação da inflação anual média durante o mandato, temos o seguinte resultado:

  1. A maior inflação foi a de Armínio Fraga, com 8,7%
  2. A segunda maior inflação foi a de Alexandre Tombini, com 7,3%
  3. Em terceiro lugar, temos Henrique Meirelles, com 5,8%
  4. No caso de Roberto Campos Neto, se considerássemos apenas os quatro anos durante o governo Bolsonaro, ele subiria para o terceiro lugar, com 6,2%. No entanto, quando consideramos os seis anos de seu mandato, sua média de inflação cai para 5,6%
  5. O menor resultado foi alcançado por Ilan Goldfajn, com 3,5%

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Taxa Selic e taxa de juros real

Agora, a taxa básica de juros média anual praticada durante as presidências:

  1. Armínio Fraga, com 19,4%
  2. Henrique Meirelles, com 14,6%
  3. Alexandre Tombini, com 10,7%
  4. Ilan Goldfajn, com 9,3%
  5. Roberto Campos Neto, com 8,2%

Essa é a taxa de juros praticada durante o período, a taxa de juros real média foi a seguinte:

  1. Armínio Fraga: 9,9%
  2. Henrique Meirelles: 8,4%
  3. Ilan Goldfajn: 5,6%
  4. Alexandre Tombini: 3,2%
  5. Roberto Campos Neto: 2,5%

Porém, se considerarmos apenas os quatro anos do governo Bolsonaro, a taxa de juros real seria de 0,1%. 

Mas antes de comemorar esse resultado durante o governo Bolsonaro, é importante destacar que essa é uma das críticas que eu tenho, mas vou deixar para o final do artigo.

Ao analisar o gráfico com a taxa básica de juros e a inflação no período, podemos entender melhor a questão da herança recebida e como ela influencia os rumos futuros dos resultados e das políticas do Banco Central.

Por exemplo, Henrique Meirelles herdou tanto a taxa de juros elevada quanto a inflação alta e não podia simplesmente derrubar os juros à revelia da inflação naquele momento. 

Da mesma forma, quando Roberto Campos Neto iniciou o governo Lula, a taxa de juros já estava em 13,75%.

Não é possível simplesmente reduzi-la à força rapidamente, pois isso provocaria uma crise de confiança, faria os capitais fugirem do Brasil e a taxa de câmbio dispararia.

Esse é o desafio da política monetária: a bagagem ou as condições iniciais limitam os movimentos bruscos na taxa de juros e na política cambial, pois podem gerar consequências significativas, como desvalorização da moeda e mudança nas expectativas dos agentes econômicos. 

Esse é o problema, para o bem e para o mal, das circunstâncias iniciais que cada presidente do Banco Central recebe ao assumir o cargo.

Taxa de câmbio

Finalmente, o desempenho da taxa de câmbio ao longo desse período, que foi bem diferente, especialmente no mandato de Henrique Meirelles, que recebeu um câmbio muito depreciado, muito além dos fundamentos.

Isso significa que, com esse overshooting na taxa de câmbio, o cenário era relativamente mais fácil. 

Adotando uma política monetária e fiscal austera, era possível ver o câmbio se valorizar nos meses e anos seguintes. 

E foi exatamente o que aconteceu.

É importante mostrar a performance do câmbio de cada presidente usando um gráfico com base 100, que representa o início do mandato:

Na ordem de maior desvalorização do câmbio, ou seja, da pior para a melhor performance, temos:

  1. Alexandre Tombini, quando o dólar disparou 109%;
  2. Armínio Fraga, o câmbio disparou 89,5%;
  3. Roberto Campos Neto, com uma alta de 66%. Porém, se considerarmos apenas os quatro anos de governo Bolsonaro, a desvalorização seria de 40,8%;
  4. Ilan Goldfajn, com uma alta do dólar de apenas 5,2%;
  5. Henrique Meirelles, com uma forte valorização do real, fazendo o dólar cair mais de 50%.

Novamente, as condições iniciais influenciam, e muito, o rumo futuro da política monetária e, muitas vezes, da taxa de câmbio.

Além disso, há a questão global: qual era a conjuntura econômica mundial? 

O dólar estava se valorizando ou se desvalorizando em relação às demais moedas? 

Era um momento de dólar forte ou de dólar fraco?

Nesse sentido, é importante analisar não apenas a taxa de câmbio do real brasileiro, mas também o índice do dólar (DXY).

Como podemos observar, em momentos em que o dólar se fortalece, o real tende a se enfraquecer. 

Da mesma forma, quando o dólar perde força, o real costuma se valorizar.

Porém, há meses e anos em que essa correlação descola. 

O real pode se desvalorizar mesmo em um momento de fraqueza global do dólar ou pode se desvalorizar muito mais do que outras moedas. 

Foi exatamente isso que aconteceu no final de 2019 e início de 2020, durante a pandemia, quando o real brasileiro se descolou do restante do mundo e se enfraqueceu em relação a praticamente todas as moedas do planeta.

Enfim, pela comparação objetiva, esses são os resultados de cada presidente. 

São números que qualquer um pode verificar e comprovar, portanto, fatos incontestes. Cada um tire sua própria conclusão.

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Avaliação subjetiva do mandato de Roberto Campos Neto

Agora, falando sobre a avaliação subjetiva, é claro que essa está mais sujeita ao debate e à discordância. 

Mas esta é a minha avaliação pessoal, seguindo o meu viés, o meu marco analítico e teórico.

Vou discutir os seguintes pontos sobre o mandato de Roberto Campos Neto:

  • Politização
  • Comunicação
  • Agenda de Inovação
  • Agenda de Conversibilidade do Real Brasileiro
  • Política Monetária e Cambial
  • DREX

Politização

O primeiro ponto que preciso refutar é a questão da politização excessiva do Banco Central. 

Essa é, sobretudo, uma crítica da esquerda e do presidente Lula, uma crítica exagerada, excessiva e quase paranoica, de que Roberto Campos Neto estaria sabotando seu governo, jogando contra a economia brasileira e praticando juros muito altos apenas para prejudicar a atual administração.

É claro que essa afirmação é uma inverdade.

Primeiro, começando pela própria alta de juros. 

O ciclo de aperto monetário foi praticado ainda durante o governo Bolsonaro e em ano eleitoral. 

Não se tem notícia, na história recente brasileira, de um período com tamanha elevação de juros em meio a uma eleição.

E quem mais seria prejudicado por isso? 

O próprio incumbente, o governo Bolsonaro, que acabou perdendo a eleição. 

Se Bolsonaro tivesse ganho, ele também começaria seu segundo mandato com a taxa de juros em 13,75% e, possivelmente, também passaria a criticar Roberto Campos Neto por um nível de juros tão elevado.

Portanto, usar essa narrativa de que ele praticou uma taxa de juros muito elevada não faz sentido. 

Não concordo e não acho que houve politização. 

Pelo contrário, acredito que ele foi bastante neutro, especialmente durante o período eleitoral, o que ficou evidente em suas decisões.

O que se segue depois do início da presidência de Lula são questões ligadas ao próprio programa de governo, especialmente os eventos dos últimos seis a doze meses. 

A desconfiança generalizada em torno da falta de compromisso fiscal impactou, e muito, a taxa de câmbio e diversas outras variáveis.

Não vou me aprofundar nesse tema, pois já fiz vários vídeos sobre isso, que você pode encontrar no meu canal no Youtube.

Mas, sem dúvida, para mim, a politização não foi um problema. Discordo de quem critica Roberto Campos Neto por ter politizado a política monetária.

Comunicação

Do ponto de vista da comunicação do Banco Central e de Roberto Campos Neto, talvez essa questão não seja restrita apenas a ele, mas a toda a diretoria do Banco Central.

Considero que, durante seu mandato, a comunicação foi excessiva. 

Houve muitas entrevistas, muitas lives, especialmente durante a pandemia, com vários diretores do Banco Central. 

Isso gerou muito ruído, influenciando as expectativas dos agentes econômicos.

Qualquer mudança de rumo na política monetária, alguma dúvida ou receio do Copom (Comitê de Política Monetária) acaba transparecendo e contaminando as expectativas do mercado. 

Muitas vezes, isso pode até comprometer as decisões futuras do Copom.

Acredito que esse problema ocorreu com frequência durante o mandato de Roberto Campos Neto e continuou nos últimos meses. 

Para mim, esse foi um ponto negativo: uma comunicação excessiva que gerou muitos ruídos.

Agenda de inovação

Pois bem, precisamos falar da agenda de inovação do Banco Central, que foi colocada em marcha especialmente quando Roberto Campos Neto assumiu a presidência. 

Confesso que tenho sentimentos mistos

Por um lado, vejo como muito positivo o Banco Central adotar novas tecnologias e fomentar o desenvolvimento do mercado financeiro, incentivando a inovação e a criação de novas soluções por meio da tecnologia, das fintechs e afins. 

Entendo isso como algo fantástico e necessário.

Por outro lado, o Banco Central, sob a presidência de Campos Neto, também assumiu para si o papel de inovador, protagonizando muitas inovações, o que, de certa forma, levou à centralização de algumas delas. 

Isso acabou barrando, impedindo ou frustrando inovações da iniciativa privada, fintechs e empresas de tecnologia.

Nada ilustra melhor esse ponto do que o Pix, que é celebrado no Brasil e até no mundo como uma rede de pagamentos instantâneos. 

Sem dúvida, ajudou muita gente, desde pessoas físicas até pequenos comerciantes. É difícil criticar o Pix.

No entanto, precisamos lembrar do contexto em que ele foi lançado e do que estava acontecendo no mundo da tecnologia de pagamentos naquele momento.

E eu me lembro muito bem de junho de 2020, já em meio à pandemia, quando o WhatsApp anunciou pagamentos pelo seu aplicativo. 

O Brasil seria o primeiro país a iniciar essa modalidade dentro do aplicativo de mensagens.

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Descrição gerada automaticamente

Fonte: https://www.tecmundo.com.br/software/154154-whatsapp-libera-pagamentos-envio-dinheiro-brasil.htm

Na semana seguinte, o Banco Central barrou e suspendeu essa inovação, sob a alegação de que poderia minar a competitividade, aumentar a concentração de pagamentos e gerar custos e riscos de uso não autorizado de informações. 

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Fonte: https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/06/23/bc-suspende-servicos-de-pagamento-de-transferencia-do-whatsapp.htm

Aqui está o texto com a justificativa do Banco Central:

Uma imagem com texto, captura de ecrã, Tipo de letra

Descrição gerada automaticamente

Fonte: https://www.bcb.gov.br/detalhenoticia/17108/nota

Mas a verdade é que o Banco Central estava desenvolvendo sua própria solução de pagamentos instantâneos. 

Ou seja, impediu a inovação da iniciativa privada, usando seu poder legal e sua autoridade para barrar esse avanço. 

Logo depois, como aconteceu em outubro e novembro de 2020, o Banco Central apresentou ao mundo o Pix.

Não é assim que deveria funcionar. 

Confesso que isso deixa um gosto amargo, pois a inovação foi barrada ou obstruída pelo Banco Central, pelo governo. 

Honestamente, eu gostaria que o Banco Central tivesse permitido a inovação dentro de um mercado competitivo e sem barreiras de entrada.

Agenda de conversibilidade

Outro ponto que precisamos avaliar, desta vez positivamente, foi a agenda de conversibilidade do real brasileiro.

Essa era uma iniciativa liderada por Roberto Campos Neto para tornar o real uma moeda plenamente conversível – algo que ainda não é – ou seja, livre de qualquer controle ou restrição à entrada e saída de capitais. 

Infelizmente, essa agenda não prosperou tanto quanto deveria, e há o receio de que não avance daqui para frente. Eu diria que não.

Ainda assim, era uma agenda positiva e necessária. 

O problema é que, de certa forma, o próprio Campos Neto ou o Banco Central acabou frustrando essa iniciativa ao permitir uma forte desvalorização e grande volatilidade da taxa de câmbio. 

Isso mina os esforços de liberalização dos fluxos de capitais, de tornar a moeda plenamente conversível. 

Quando há oscilações bruscas na taxa de câmbio, cresce a pressão para instituir algum tipo de controle ou barreira. 

Sempre que o real se valoriza muito ou a taxa de câmbio fica excessivamente volátil, surgem propostas para a aplicação de IOF ou outras restrições.

Portanto, a intensa volatilidade e a desvalorização da nossa moeda também frustraram, em parte, a agenda de conversibilidade do real brasileiro.

Política monetária e cambial

Chegamos aos dois pontos finais, que considero minhas maiores decepções com a presidência de Campos Neto.

O primeiro é a política monetária e a política cambial, que, de fato, tiveram grande influência de Paulo Guedes. 

Todos se lembram quando ele dizia que o mix de política havia mudado: o fiscal seria mais apertado e o monetário mais frouxo. E isso foi ainda em 2019, antes da pandemia.

Já naquela época, no final de 2019, eu critiquei essa abordagem, alertando para os riscos e para o perigo de manter os juros muito baixos em relação à taxa americana e ao cenário econômico brasileiro. 

Essa estratégia não era compatível com um país emergente que ainda enfrenta diversos desafios. 

O risco era que essa política pudesse ter um efeito contrário ao esperado — e foi exatamente o que aconteceu.

Campos Neto herdou a casa arrumada de Ilan Goldfajn, com o câmbio relativamente estabilizado e a taxa de juros em 6,5% — essa era a taxa Selic no início de seu mandato. 

No entanto, ele deu início a um ciclo de cortes na Selic até o final de 2019 e fez a taxa de câmbio disparar para seu maior patamar em termos nominais ainda em 2019.

Paulo Guedes desdenhava dessa situação (e muito), afirmando que não era um problema e que o país poderia vender reservas e ganhar mais reais com o câmbio depreciado. 

Porém, quando veio a pandemia, o problema se tornou ainda maior. No primeiro semestre de 2020, a taxa de câmbio chegou a testar quase R$ 6 por dólar.

Foi então que veio a segunda aventura, que, para mim, foi uma das maiores decepções e um grave erro de política monetária: reduzir a taxa Selic para 2% ao ano

Taxa Selic de 2% ao ano. No Brasil.

Pode-se argumentar que, naquele momento, o mundo inteiro enfrentava uma possível depressão, com incertezas absolutas sobre o futuro da economia global. 

Concordo que havia um nível de imprevisibilidade inédito

No entanto, justamente em tempos de crise e instabilidade financeira, o correto seria adotar uma postura mais cautelosa, defendendo a moeda e evitando políticas monetárias excessivamente expansionistas. 

No mínimo, o Banco Central deveria ter mantido a taxa de juros ou até mesmo elevado os juros para conter o risco cambial, em vez de reduzi-los a um patamar historicamente baixo.

Como se não bastasse, além de cortar os juros para 2%, o Banco Central adotou o chamado forward guidance — uma ferramenta de política monetária importada dos Estados Unidos, especialmente do Federal Reserve. 

O objetivo era sinalizar ao mercado que os juros seriam mantidos em um patamar “x”, por “x” meses ou anos. 

Essa era a ideia com o forward guidance, uma piada para uma economia como a brasileira

Isso ocorreu no final de 2020 e, já no início de 2021, foi necessário abandonar o forward guidance

Ficou evidente que a inflação estava em alta, o câmbio permanecia depreciado e manter os juros em 2% tornou-se insustentável, bem como a orientação prospectiva de juros em 2%, que se manteriam por meses a fio.

Diante desse cenário, observamos a maior elevação da Selic.

Esse foi o erro seguinte, decorrente do erro anterior. 

Primeiro, derrubar a Selic para 2% e mantê-la nesse patamar por meses. 

Depois, precisar corrigir essa decisão com uma elevação extrema dos juros, que chegaram a 13,75%

Esses dois extremos estão relacionados.

Essa política monetária, aliada a um câmbio frouxo e a uma forte desvalorização do real, foi, para mim, uma grande decepção. 

Talvez tenha sido uma ilusão minha acreditar que Campos Neto e Paulo Guedes defenderiam a moeda brasileira

Mas, desde 2019, ficou claro que a estratégia adotada foi outra: estimular a economia por meio da desvalorização cambial — um erro que se revelou extremamente prejudicial.

DREX

E assim chegamos à minha maior crítica, que considero um dos piores legados de Campos Neto: o Drex, o real digital

Em nome da inovação tecnológica, esse projeto acaba contrariando o ideal de liberdade tão bem defendido por seu avô, Roberto Campos.

Em essência, trata-se da tentativa de criar a moeda digital do Banco Central do Brasil. 

A boa notícia, por ora, é que esse projeto, na forma em que foi concebido, é o que se chama de moeda digital de banco central do atacado. 

Ou seja, seria utilizado apenas entre bancos, impactando mais o mercado de capitais e o setor financeiro, sem alterar diretamente a relação entre correntistas, bancos comerciais e o Banco Central.

Atualmente, o Drex está desenhado e sendo testado como uma evolução tecnológica. 

No entanto, existe o risco de que ele evolua para uma moeda digital de banco central de varejo, e aí sim teríamos um potencial monstrengo totalitário

Esse é o grande risco, pois colocaria nas mãos do Banco Central — e, consequentemente, do governo — um poder quase absoluto sobre o nosso dinheiro.

Ninguém deveria ter esse poder. 

É uma lástima que essa inovação tenha sido lançada justamente durante a presidência de Campos Neto.

Afinal, que resumo podemos fazer do legado de Roberto Campos Neto?

Resumindo, o cômputo final, considerando todos esses pontos: na minha avaliação, o legado de Campos Neto é negativo.

Ele nos entregou uma moeda muito mais desvalorizada, com a inovação concentrada nas mãos do Banco Central, além de um projeto de moeda digital, que, no futuro, pode evoluir para um dispositivo que ameaça a privacidade e a liberdade dos brasileiros.

Minha única esperança é que a gente não sinta saudades de Campos Neto, se é que você me entende.

Em um passo a passo simplificado, descubra como montar uma exposição antifrágil na prática.

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